Qual é a verdadeira face ética?

RIBEIRO, Schaiane
Há algum tempo fiz a leitura do livro Psicologia Social Crítica como prática de libertação, de Pedrinho Guareschi e na semana passada entrei em contato novamente com a obra, pois fiz a releitura do capítulo 15 da mesma para fins acadêmicos. Me ocorreram alguns questionamentos que na primeira leitura não me ocorreram, talvez pelo período de mudanças pelo qual estou passando, mudanças para melhor.
Ao reler o capítulo Ética: uma presença indispensável, da obra de Pedrinho Guareschi, remoto-me ao primeiro dia de aula da cadeira de Ética Profissional da Escola de Psicologia, onde cada um dos acadêmicos foi questionado a respeito do significado da palavra ética, pois, me identifico com a afirmativa do autor anteriormente referido que traz este questionamento como confuso, uma vez que não é costumeiro refletir sobre o mesmo.
Guareschi coloca neste capítulo a ética como algo que diz respeito a conceitos bons e ruins, algo valorativo, cujo este valor depende das experiências vividas pelo sujeito em seu contexto histórico, social e familiar.
Portanto, penso que todas as ações e relações estabelecidas pelos homens debelam questões valorativas, uma vez que ao emitir uma ação o sujeito já não se mantém na neutralidade, tomando assim, um posicionamento que já vem carregado de ideologia, interesses comuns e valores compartilhados por um grande grupo no qual convive.
Ao decorrer da leitura, percebo que ao tocar na questão da técnica, o mesmo autor, é categórico ao dizer que a esta é neutra e não implica juízos de valores, por isto, não tem relação com a ética. Entretanto, saliento meu pensamento de que se existe uma técnica, existe alguém por trás da mesma em sua execução, e este alguém, carrega consigo, crenças de valores éticos bons ou ruins, adequados ou inadequados para aquele momento histórico. Já ao tratar sobre questões científicas, Guareschi refere que a ciência é sempre uma ação, logo, sempre terá a ética em seu envoltório, porém, entendendo a ética como um padrão de valores bons ou ruins e analisando a colocação do autor ao citar a obra cinematográfica “Laranja Mecânica” de que “se funciona, é bom”, me questiono se tudo aquilo que funciona e é bom é bom também eticamente, uma vez que acredito existir a hipótese de que algo que é cientificamente comprovado que é bom pode ser eticamente ruim.
Anteriormente a discussão sobre as teorias que fundamentam a Ética, o autor, faz uma breve explanação sobre a diferença entre moral e ética. A explanação sobre a primeira, me remeteu a lembrança da obra de Freud, Totem e Tabu, que discute a formação da moralidade nas sociedades primitivas, o que me faz pensar que a moral surgiu antes da ética, uma vez que cada cultura tem seus hábitos morais, e aquilo que para alguns é amoral, para outros é simplesmente cultural, nascendo assim, na minha concepção, as diferenças, já que penso que tudo aquilo que é diferente é desconhecido, entretanto o desconhecido não é diferente aos olhos daquele que não conheço. Em sua explanação sobre ética, Guareschi refere ser esta, uma espécie de reflexão crítica sobre a moral.
A primeira das teorias que fundamentam a ética contemplada pelo autor é o paradigma da lei natural, onde, segundo ele, a base sobre a fundamentação de ação em bom ou ruim está na natureza. O autor então questiona se pelo fato de o homem ser inteligente e criativo não poderia agir de forma a transformar a natureza para determinadas finalidades. Penso que não, pois o homem é parte da natureza, e muitas vezes não consegue nem agir de forma a transformar seus impulsos para determinadas situações pessoais.
A segunda teoria afirma que o fundamento da ética é a lei criada pelos seres humanos. Para mim, é mais fácil compreender e concordar com esta teoria, porém, penso que nem toda a lei criada pelos seres humanos é ética, penso que estas leis se parecem mais como uma forma de manter a moralidade do que a ética, para exemplificar, cito os códigos de ética das profissões, às vezes estes códigos me parecem muito mais úteis para se manter uma moral aparente entre os colegas de profissão, do que para realmente manter a ética.
A última das teorias que o autor traz no capítulo define a ética como uma instância crítica e propositiva do dever ser das relações humanas que se constitui através da ação comunicativa. Ou seja, não existe ética em um contexto individualizado, seja boa ou má, a ética sempre terá em seu ponto de partida as relações interpessoais, uma vez que é também deste contexto relacional que surgem as reflexões sobre o que é moral ou não, reafirmando a opinião do autor no começo da discussão ao dizer que a ética é a crítica da moral.
Para tanto, considero que a releitura do capítulo me despertou questionamentos ao mesmo tempo em que me forneceu respostas para dúvidas sobre o surgimento da ética, as diferenças entre ética e moral e a importância de ter um posicionamento, uma vez que em cada ação executada deixamos transparecer nossa verdadeira face ética e nossas verdadeiras crenças morais frente nossa cultura e sociedade.
Tenho refletido nestes últimos dias que esta transparência da verdadeira face ética tem sido fundamental para a compreender do que realmente é constituída a mente e personalidade das pessoas. Às vezes o poder de persuação é um poder "enganatório", e quando conseguimos visualizar o vasto campo existente que se esconde na máscara utilizada por alguns, vemos esta verdadeira face ética do ser humano.
Afinal, o que é ser eticamente humano, em um tempo que é difícil reconhecer quem é verdadeiramente humano, não no sentido literal, mas no sentido metafórico da expressão? Acabo de me lembrar de uma frase Nelson Rodriguês que diz: "Quando os amigos deixam de jantar com os amigos (por causa da ideologia), é porque o país está maduro para a carnificina." Encerro este texto com esta frase por dois motivos, primeiro por manter uma profunda admiração pela obra Rodrigueana, e segundo, por sentir a necessidade de pensar na minha ideologia. Acredito que pensar minha ideologia é ser ética comigo neste momento.

Comentários

  1. discussão infinita, bom é ter sempre novos elementos que alimentem nossa reflexão, mesmo que esses novos elementos sejam frutos de revisões a textos e experiências anteriores, parabens pelo texto

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  2. Oi Schai, muito boas as reflexões. Gostaria de pontuar a ausência de uma outra ética: a ética oriunda da religião. Talvez esta seja uma das mais influentes, pois a religião é parâmetro de vida para bilhões de pessoas no mundo. Entretanto, fica no ar a questão: se dependemos de um ser superior (na psicanálise, o Pai) para "olhar" se nos comportamos bem, onde estará a nossa auto-direção? Se precisamos ainda, no assoalho de nossa instintualidade de algo "de fora" para dar o limite, é porque ainda não conseguimos nos conter...

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  3. Ética e Moral - Ciência e objeto. Moral questão da personalidade do indivíduo, ética comportamento padrão.

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