Bem me quer, mal me quer: O amor, o ódio e o desejo por consequência

Artigo publicado na coluna Comportamento e Atitude, do caderno DM em Revista.
Jornal Diário da Manhã. Passo Fundo. 26 e 27 de maio.
Por: RIBEIRO, Schaiane.

Lembro de que uma destas noites chuvosas, quando não se sai de casa e se prefere ficar embaixo do edredom, tive a oportunidade de ouvir em um programa de televisão a seguinte frase: ”Fica quieta e ‘bota’ a minha comida”, a partir disto fiz uma analogia com as relações de sadismo e masoquismo e fiquei me questionando sobre a violência doméstica e os chamados “amores bandidos”.

Geralmente nas relações dos chamados amores doentes ou bandidos encontra-se sempre um que exerce o domínio, e outro que é dominado, alterando assim doses de sofrimento e paixão o que gera a ambivalência da relação. A impotência do dominado se torna arrebatadora e torna o ser humano insensato, o amor ardente embota a racionalidade e torna a relação abusiva e viciante, até o ponto de surgir a violência doméstica, onde o dominado vive uma vida tóxica, de dependência emocional, dependência do outro. Assim como existem pessoas que não resistem ao desejo do álcool e outras drogas, existem aquelas que não resistem a sedução do outro, comparando-se, metaforicamente e muito superficialmente com outras patologias, atrevo-me a dizer que se assemelha a bipolaridade, ou seja, assim como na bipolaridade hora se está na mania, hora na depressão, na relação viciante do “amor bandido” hora se está na briga, hora no desejo, como em uma brincadeira de infância de mau me quer, bem me quer.

Os traços depressivos, tristes e o sentimento de vergonha daquele que sofre a violência são disfarçados, muitas vezes, pela raiva que esconde, pelo medo do outro e os conflitos de uma relação mal resolvida. Pergunta-se então, porque esta pessoa que sofre a violência simplesmente não pede a separação, e o surpreendente muitas vezes é ouvir a resposta: “se está ruim com ele, pior sem ele”.

Talvez isto se explique pelo temor da solidão, e temendo ficar só quem sofre a violência deposita no outro confiança e o desejo da mudança, uma vez que pensa ser sempre o outro quem precisa mudar. Na realidade esta mudança precisa ser sistêmica, de forma a deixar a estrutura que esta configurada, funcional, pois, na medida em que se o amor pelo outro passa pela a raiva de si mesmo há a permanência de um pensamento regressivo, e ocorre a tolerância a situação.

Quem são os culpados? Na verdade ambos têm o desejo de manter uma relação idealizada, e nesta relação não existe espaço para aceitar que as coisas mudam, não existe lugar para suportar a realidade do dia-a-dia, logo nos “amores bandidos” a vítima também é bandido, pois ambos estão aprisionados e não tem a chave da porta da prisão. Cabe lembrar que as relações são formadas de 50% de cada um, de forma que ninguém é totalmente vítima nem totalmente culpado.

O casal que vive uma relação de amor disfuncional sempre tende a pensar que tudo é “apenas uma fase”, e tornam-se marionete um do outro, não conseguindo estabelecer vínculos sustentáveis e no lugar de oferecer o que tem de melhor ao outro para ascender seu crescimento, atua a construção mal resolvida do outro.

É claro que amores disfuncionais ou “bandidos” ou “doentes” não justificam a violência doméstica, ao contrário, a violência é o último estágio de um amor disfuncional, pois o “amor bandido” mau trata em silêncio, quando a violência física surge este silêncio é quebrado pois o outro já se transformou em figura depositária para o amargo de uma relação.

E, então o que fazer para mudar isto? Eu diria conhecer a si mesmo, esta é a melhor maneira de conhecer o outro, afinal o homem é mil e apenas um.

No amor funcional, existe a troca, a entrega e a proximidade, nele os personagens utilizam os olhos da “alma”, os ouvidos do coração e também da razão, pois o amor às vezes necessita ser racional.

O amor conjugal é como embalagem, à medida que se abre se descobre o produto.

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